Monday, October 31, 2005

Angelus, de Millet























Pode-se perceber sua incrível beleza na veracidade passada pelo pintor, que retrata a cena sem ser possível que encontremos traços de pinceladas - coisa que Da Vinci também fazia. Reza a lenda, esta já publicada em livro ao qual o nome eu não tenho acesso - maneira estilosa de dizer que não sei -, que Millet havia pintado este quandro com um caixão no lugar da cesta de palha vermelha. Quando uma oportunidade de participar de um concurso de arte surgiu, Millet teria mostrado a pintura que inscreveria no concurso a um amigo bem próximo. Este, por sua vez, o aconselhou a mudar algo na pintura, que ao mesmo tempo em que era demasiadamente bela, iria chocar a todos pelo que estava retratado nela. Millet teria substituído, então, o caixão pela cesta, colocado uns sacos de batata no carrinho e pintado umas batatas mais à esquerda, em frente ao ancinhó - essa mistura de pá com tridente. Algumas fontes também afirmam que Salvador Dalí teria sido o primeiro a descobrir que na pintura haveria um enterro disfarçado. Ele teria percebido que atrás da mulher, em frente ao carrinho, há um monte de ossos por cima da terra. Salvador Dalí fez diversas referências a esta obra de Millet, inclusive reproduzindo-a com precisão, como um quadro preso na parede da casa de um dos personagens de uma de suas pinturas - que também não sei o nome.

Friday, October 28, 2005

A chuva, carregando as bostas flutuantes

Chove mais uma noite. O tempo lá fora refletindo o que se passa em minha mente, um temporal, um fenômeno que vem de tempos em tempos, buscando limpar toda a sujeira que foi deixada ali. Lavo o rosto e cuspo sangue. Olho para o sangue, vermelho como a guerra, um nascimento, um renascimento. Era disso que eu mais precisava neste momento. Decepções, meu deus, como eu me decepciono! Essa mania de colocar as pessoas em um pedestal, acreditar em suas convicções vazias, seus desejos de ser algo que elas não são e nem nunca serão, porque não passam de umas bostas poluentes e errantes. O relógio mostra que estou atrasado, corro o risco de perder o show; mais uma vez. Sinto que meus pudores estão sumindo, me sinto mais confiante e ao mesmo tempo gostando cada vez menos do convívio social. Não de todo o tipo de convívio, lógico. o ponto é que, não acreditando mais nas falsidades e não sendo mais capaz de agüentar a pequenez de certos seres, acabo por selecionar demais minhas companhias. E isso causa um certo isolamento. Acredito que, no entanto, não esteja me sentindo mais infeliz – todos nós temos graus de infelicidade, cada um o seu -, muito pelo contrário! Uma vez que você passa a entender melhor quem você é e à que se dedicar, quais as coisas que te fazem ser singular, ser você, não há solidão que te abale – isso seria algo mais hipotético, não sendo totalmente absoluto, mas funciona, lógico. A melhor companhia que se pode ter é a sua própria. Mas isso só serve se você estiver de bem consigo mesmo, porque quando não se gosta ou não se entende realmente o que se é, tudo que se busca é estar na companhia dos outros, sendo a maior infelicidade a de ter que se deparar com a sua íntima realidade. Se olhar no espelho e conversar consigo mesmo, tentar se entender. Mas me parece, hoje, ser o único meio de se encontrar a tranqüilidade “espiritual”, a da consciência.

Wednesday, October 26, 2005

O mal necessário

Escrevo.
Aqui sento e me ponho a desenhar,
passando para o papel o mundo fantástico
que habita em minha mente,
com criaturas incríveis, viagens mais que impossíveis
e você.

Sua atenção eu nunca tive,
e nem, provavelmente, jamais hei de ter.
Suas palavras cruéis,
seus ímpetos destrutivos, embora inconscientes
- mas nem tanto; mostra seu desejo de quebrar as regras
e ver os limites -,
e seu jeito de contemplar.

Seu olhar me desconcerta
me faz acreditar no inverso das coisas,
minha realidade saindo dos eixos.
Sua boca,
seu beijo que já sonhei sentir,
sua pele,
minha desgraça e minha salvação.

Em meu sonho lúcido busco por você,
embora não saiba se, estando ao seu lado,
(?) seria realmente feliz.

Palavras tolas, embora sinceras, que me fazem caminhar parado. Estático, me resumo à minha insignificância, esta às vezes substituída pela glória de ser algo que ainda não compreendo - assim como todos os outros -, enquanto recebo aplausos silenciosos pela peça que representei e o mundo assistiu, mesmo sem ter percebido.

Friday, October 14, 2005

O fim de um ciclo

E mais uma vez acontece. Aquele momento do qual ninguém gosta. Ambas as partes tristes por ter chegado este momento, que mostra o quanto a mente humana é complicada e que, na verdade, estamos todos sozinhos no mundo – em termos. Ela olha para ele, tentando enxergar o que eu se passa em seu interior; quer dialogar. Ele, enquanto isso, tenta esconder a lágrima que escorre em sua mente, mas que ela pode ver pela sua expressão. Silêncio. Seus olhares se encontram, mas se perdem muito longe dali. Em suas mentem passam flashes dos dias que passaram juntos, quando ainda acreditavam no amor. Um amor que teria surgido como um acidente em alta velocidade, arrastando os dois para o mesmo lugar, sem mesmo se conhecerem, e transformando aqueles dois corpos, e suas mentes também, em uma coisa só, um único ser. Mas agora acabou, já ficou para trás. O medo de que não dê certo, a inconstância de quem foi criado em um mundo de contos de fadas e papai Noel, os fantasmas do passado e a errônea assimilação desta situação com outras ocorridas anteriormente. Tudo isso conspirando contra a felicidade dos dois. Ele coloca a mão no rosto dela e a olha com um carinho muito bonito e sincero. Ela suspira, vira os olhos e depois o rosto para o lado, e treme. Treme por saber que está estragando algo que lhe faz bem. Treme porque não entende. A mão dele continua a fazer carícias por alguns instantes e depois cessa. Ele se recolhe, respira fundo e se levanta. Neste momento ela já começa a sentir a sua falta e o olha como se estivesse prestes a perder algo que deseja com bastante força. Ele acende um cigarro e guarda o isqueiro no bolso. Olha para as luzes dos postes enfeitando a cidade à noite, num dia em que a cidade parece ter morrido, todos recolhidos dentro de suas casas como se sentissem a dor dos dois. Ela pede um cigarro. Ele pega o isqueiro no bolso, acende o fogo olhando nos olhos dela e pega em sua mão, que aperta com todos os seus sentimentos. Abre a mão dela, coloca o isqueiro dentro e fecha com a outra mão. Um sinal de adeus. Uma lágrima no rosto dela escorre. Lágrima esta que ele limpa com a mão e, puxando-a para perto beija seus olhos, ambos. Calafrios nos dois. Ele beija a mão dela e, esfregando-a em seu rosto diz adeus, sem nenhuma palavra. Ela pede para ele ficar, mas em silêncio. Ambos querem isso. Querem ficar juntos mais um pouco, ainda não estão prontos para andar sem a companhia que tinham. Mas, suas mãos se soltam e eles vão. Cada um para um lado, sonhando com o dia em que se verão novamente.