Monday, September 03, 2007

A praça abandonada

Um passo e mais outro. E mais outro e outro depois deste. Os sapatos gastos pisam na calçada suja, molhada com a água da chuva de ontem que se misturou à poeira do centro da cidade, andando sem parar, como se não tivessem nada melhor para fazer. Mas têm. Só que isso, agora, não importa. É preciso seguir o caminho, seguir em frente porque quem fica para trás está perdendo.

No meio do breu, as luzes dos faróis dos carros cortam o escuro, abrindo caminho pela noite em grande estilo, nestas ruas quase sem iluminação que ninguém realmente sabe como são durante o dia, uma vez que aqui parece não haver o dia.

O cheiro de xixi dos gatos abandonados, que se multiplicam a cada ano e já dominaram a praça que fica no caminho do trabalho para casa, é terrível. Desejaria, talvez uma rinite para, quem sabe, conseguir ficar alguns dias sem ter que passar por isso. Ou será que não? Seria ruim demais perder a capacidade de sentir o odor de todas as coisas boas, nem que fosse por apenas algum tempo, para assim conseguir evitar este incômodo? Talvez, mas isso é algo que provavelmente ficará sem resposta.

Os gatos são muitos e ocupam todo o quarteirão. Eles andam à espreita, observando e se esquivando enquanto a praça não fica para trás. Ficam aos pés das árvores, dentro e fora das latas de lixo, revirando-as não apenas em busca de comida, mas também por esporte – afinal, eles são gatos e precisam fazer este tipo de coisa. Seus olhos, malvados, sem caráter, brilhando no escuro. Parecem conspirar para que algo de errado ou, quem sabe, planejam algo de muito, muito ruim. Não seria exagero acreditar que, pelo jeito como se movimentam acompanhando quem passa por perto, estariam esperando apenas esperando uma oportunidade para cercar e atacar quer chega perto.

Dizem por aí que a cada noite um passante é emboscado enquanto caminha pelo quarteirão da praça, tentando apenas chegar em casa após um longo e desgastante dia de trabalho. E é aí que os gatos vencem. Cansada e já sem cabeça para pensar muito, a vítima percorre seu trajeto sonhando apenas em deitar em sua cama e dormir, sem prestar muita atenção aos felinos que, percebendo o deslize, cercam o sujeito e partem para cima. Dizem também que eles, depois de arranhar e lamber, levam suas vítimas para um altar secreto no subsolo, no meio da quadra e de onde ninguém jamais retornou. Lá, onde ficam os gatos mais velhos, que nada fazem além de dormir e comer os alimentos trazidos pelos gatos mais novos, os que sobrevivem aos ferimentos e às noite de frio, que parecem durar dias, são obrigados a ficar, uma vez que não encontram saída – mesmo procurando por ela indefinidamente.

Mas isso não vem ao caso agora. Não é hora de gastar o tempo divagando ou pensando em coisas que ninguém sabe ao certo se são verdade ou não. É preciso manter o rumo, seguir o caminho. Não é bom ficar para trás. Ninguém gosta de ser o último, de ficar perdido. Não é mesmo? Neste momento tudo que eu quero agora é chegar logo em casa, depois de ter um dia tão desgastante.

Só que a rua está completamente deserta, sem nenhuma alma humana passeando por estas bandas. E os gatos continuam a me olhar. E eu não gosto nada disso.

Friday, July 27, 2007

Quase meia-noite

Cansaço, vontade de me jogar na cama - que ao mesmo tempo em que recarrega minhas energias, me toma outras, uma vez que tem me trazido muitas dores... físicas, mesmo. Felicidade e fragilidade ainda andam lado a lado, trocando olhares com a confiança que vem com a idade. Sim, estou ficando velho. Velho também para ficar reclamando do tempo ter passado tão rápido - o que, dependendo do caso, é até melhor.

A desilusão é constante, principalmente quando tentamos, incoscientemente e a todo tempo, eleger mestres para podermos seguir. Aqui se manifesta noavmente a necessidade do ser humano de encontrar uma segurança, um alicerce que nos livre da sensação de total abandono nesta terra (qualquer terra). Uma das poucas fés que podemos ter nas pessoas, vejo cada vez mais, é em nós mesmos (salvo algumas almas merecedoras de medalhas; mas estas são poucas e... palmas para elas!!!).

Não aos ídolos! Está na hora de organizar a cabeça e resgatar aquela pequena lição de cada um, para ver se assim o verdadeiro "ideal", que é relativo - sim, porque depende do que você busca - se materialize, ao menos na imaginação. De pouco em pouco a galinha enche o papo...

É? Enche o papo, é? Pro diabo com a galinha. Frases de merda que ajudam e ao mesmo tempo emburrecem. Tudo que eu quero é dormir e... não criar conceitos equivocados.

Tuesday, March 06, 2007

Carcomido

Levanta-se. O peso do próprio corpo já ultrapassa o suportável - tantos anos de sedentarismo não poderiam ficar em vão. Tenta alcançar a porta, sua passagem para a liberdade. Sua entrada para o novo mundo, agora que finalmente deixou para trás tudo que carregava em suas costas. Seus sonhos, seus desejos, sua sede. Ah, mas que sede! Era como se nada pudesse pará-lo. Nada era capaz de satisfazer todas as vontades que mantinham este coração vivo e forte, batendo como nenhum outro. E as dores? As dores constantes de sofrer por tudo o que procurava mas acabaria por nunca encontrar, mesmo que achasse.

A idade veio, e com ela a degradação, a fraqueza. Antes era jovem, forte, impulsivo. Agora, não passa de um velho, um defunto, um corpo apenas. Uma peça de museu. Mas, uma peça de museu que tenta alcançar a porta. Com seus dedos finos e já sem pele, com seus ossos à vista, como todo zumbi que tenta ressurgir da morte, ele insiste. E a maçaneta continua tão distante quanto antes. Pensa em desistir. Seria mesmo verdade? Estaria mesmo isto acontecendo com ele? A dor é grande e a sensação é de que, apenas saindo do recinto sombrio e empoeirado, a paz pode chegar.

E ele tenta mais uma vez, com o peso do próprio corpo ultrapassando o suportável.

Tuesday, February 20, 2007

Mais uma canção (nova versão com final alterado)

Me encarando com seu olhar penetrante, ela reclama de coisas em mim que eu não pude mudar e se mostra mais insatisfeita do que o suportável. Seus argumentos fazem sentido, mas não quero pensar em nada agora. Não hoje. Depois de tudo que aconteceu, só preciso me deitar e esperar que amanhã meus problemas já estejam todos resolvidos, como num passe de mágica.

Ela pega suas coisas - calma, me refiro as coisas dela, não às suas – e se retira. “Tenho que ir pro camarim, o show começa em poucos minutos”, diz a voz grave e macia que dia desses me fisgou, antes mesmo de nos conhecermos. Peço uma bebida e espero pela salvação – neste instante qualquer coisa poderia me salvar, já que não agüento mais estar dentro dele; mas um drink vai servir.

O pub cheio, as pessoas animadas e as luzes apagadas. Apenas o bar com seus raios coloridos alegra o ambiente, esperando pelas luzes do palco ainda vazio, para que estas, junto à solidão dele - o bar -, façam companhia um ao outro. No olhar de cada estranho um tanto diferente de tristeza, a velha busca por saciar o eterno desejo por uma quebra, um pouco de aventura para tornar a vida cotidiana mais interessante, mais atraente. Procura-se o que é atraente mesmo quando isso na verdade, na prática, não significa nada, apenas te suga e pronto. Não que você esteja sendo sugado pelo que acharia melhor mas, enfim...

Enfim sobe a banda ao palco e as luzes se acendem. Minha atração, com o jeito peculiar, lidera o grupo e me faz esquecer do mal estar que dominava, ao menos para mim, todo o mundo. Não que eu esteja sendo sugado pelo que eu acharia melhor, mas no momento eu acho. Luzes, som, fumaça, ritmo, aquela voz. Ao menos por hoje vou poder conviver com os meus problemas. Na verdade ficarei imaginando o amanhã, onde, quem sabe, quando acordarmos pela manhã, o hoje ainda não será passado, mas o amanhã já será presente e, eu e ela, tão independentes e fortes quanto assustados e carentes, nos amarraremos um ao outro um pouco mais e ostentaremos um sorriso sincero por, mais uma vez, não termos outra saída.

Saturday, January 06, 2007

Mais uma canção















Me encarando com seu olhar penetrante, ela reclama de coisas em mim que eu não pude mudar e se mostra mais insatisfeita do que o suportável. Seus argumentos fazem sentido, mas não quero pensar em nada agora. Não hoje. Depois de tudo que aconteceu, só preciso me deitar e esperar que amanhã meus problemas já estejam todos resolvidos, como num passe de mágica.

Ela pega suas coisas - calma, me refiro as coisas dela, não às suas – e se retira. “Tenho que ir pro camarim, o show começa em poucos minutos”, diz a voz grave e macia que dia desses me fisgou, antes mesmo de nos conhecermos. Peço uma bebida e espero pela salvação – neste instante qualquer coisa poderia me salvar, já que não agüento mais estar dentro dele; mas um drink vai servir.

O pub cheio, as pessoas animadas e as luzes apagadas. Apenas o bar com seus raios coloridos alegra o ambiente, esperando pelas luzes do palco ainda vazio, para que estas, junto à solidão dele - o bar -, façam companhia um ao outro. No olhar de cada estranho um tanto diferente de tristeza, a velha busca por saciar o eterno desejo por uma quebra, um pouco de aventura para tornar a vida cotidiana mais interessante, mais atraente. Procura-se o que é atraente mesmo quando isso na verdade, na prática, não significa nada, apenas te suga e pronto. Não que você esteja sendo sugado pelo que acharia melhor mas, enfim...

Enfim sobe a banda ao palco e as luzes se acendem. Minha atração, com o jeito peculiar, lidera o grupo e me faz esquecer do mal estar que dominava, ao menos para mim, todo o mundo. Não que eu esteja sendo sugado pelo que eu acharia melhor, mas no momento eu acho. Luzes, som, fumaça, ritmo, aquela voz. Ao menos por hoje vou poder conviver com os meus problemas. Quem sabe quando acordarmos pela manhã, eu e ela, tudo não tenha se tornado melhor, como num passe de mágica?